No terceiro trimestre de 2024, cerca de 1,7 milhão de pessoas tiveram os aplicativos como principal fonte de renda, trabalhando por meio de plataformas digitais. Os dados foram divulgados nesta quinta-feira (17) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Apesar de representar apenas 1,9% do total de trabalhadores do setor privado, o número indica um crescimento em relação ao quarto trimestre de 2022, quando 1,3 milhão de pessoas (1,5% do total) estavam envolvidas nesse tipo de atividade.
O levantamento, realizado em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o Ministério Público do Trabalho, integra a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua).
Nesta edição da pesquisa, o IBGE analisou o trabalho realizado por meio de plataformas digitais no terceiro trimestre de 2024. As estatísticas divulgadas são experimentais, ou seja, estão em fase de teste e sob avaliação. Entenda a metodologia do estudo ao final desta reportagem.
Aplicativos de transporte lideram
Segundo o IBGE, foram identificados pelo menos quatro tipos de aplicativos utilizados como principal fonte de renda pelos trabalhadores que atuam por meio de plataformas digitais. Em 2024:
- 53,1% (878 mil pessoas) usavam aplicativos de transporte particular de passageiros (exceto táxi);
- 29,3% (485 mil) atuavam com aplicativos de entrega de comida e produtos;
- 17,8% (294 mil) usavam plataformas de serviços gerais ou profissionais;
- 13,8% (228 mil) trabalhavam com aplicativos voltados para taxistas.
Ao considerar todos os trabalhadores que utilizavam aplicativos de transporte de passageiros, incluindo táxi, o total chega a 964 mil pessoas, o que representa 58,3% dos trabalhadores plataformizados no país.
Entre 2022 e 2024, houve crescimento em todas as categorias de aplicativos analisadas. O destaque principal são as plataformas de serviços gerais ou profissionais, que registraram a maior expansão no período: 52,1%, passando de 193 mil para 294 mil pessoas.
Os aplicativos de transporte particular também cresceram de forma expressiva, com alta de 29,2% (de 680 mil para 878 mil). Já os aplicativos de entrega tiveram o menor avanço, com variação de 8,9%.
🛵 Perfil dos trabalhadores por app
A pesquisa também traçou o perfil dos trabalhadores que usam plataformas digitais de serviços como principal fonte de renda. Os homens predominam, com 83,9% do total, enquanto as mulheres representam apenas 16,1%.
Em relação à idade, quase metade dos trabalhadores por aplicativos (47,3%) têm entre 25 e 39 anos. Quanto à escolaridade, a maioria possui nível intermediário: 59,3% têm ensino médio completo ou superior incompleto.
Pessoas com nível superior completo representam 16,6%, enquanto aqueles sem instrução ou com fundamental incompleto somam 9,3%. Quanto à cor ou raça, 45,1% se declaram brancos, 12,7% pretos e 41,1% pardos.
🤑 Renda e horas trabalhadas
O levantamento mostrou que os trabalhadores plataformizados têm rendimento médio de R$ 15,40 por hora — valor 8,3% inferior ao dos trabalhadores que não utilizam aplicativos como fonte de renda, cuja média é de R$ 16,80 por hora.
Além disso, os trabalhadores que dependem de plataformas digitais têm jornada média de 44,8 horas semanais — 5,5 horas a mais que os demais ocupados, que trabalham cerca de 39,3 horas por semana.
Outro dado da pesquisa é a renda mensal. Em 2024, os trabalhadores que atuam por meio de plataformas digitais receberam, em média, R$ 2.996. Esse valor é 4,2% superior ao rendimento médio dos demais ocupados no setor privado, que foi de R$ 2.875.
Essa diferença de remuneração, porém, está diretamente ligada à carga horária mais extensa. Na prática, esses trabalhadores ganham mais porque trabalham mais tempo.
Apesar do salário relativamente mais alto, no entanto, o crescimento do rendimento entre os plataformizados foi mais tímido: 1,2% entre 2022 e 2024, contra 6,2% de aumento entre os que não dependem de aplicativos.
Em 2022, essa diferença era maior: os trabalhadores por aplicativo ganhavam 9,4% a mais.
Entre os trabalhadores com menor escolaridade, os que atuavam por aplicativos ganhavam mais de 40% a mais que os demais. Já entre aqueles que possuíam nível superior completo, a situação se invertia: os plataformizados recebiam 29,8% a menos.
De acordo com o analista de pesquisas do IBGE, Gustavo Geaquinto Fontes, a diferença nos rendimentos está diretamente relacionada ao tipo de ocupação. Entre os trabalhadores por aplicativo com menor escolaridade, cerca de 80% atuam como condutores de motocicletas ou automóveis.
Já entre os não plataformizados desse mesmo grupo, as ocupações mais comuns são elementares — ou seja, atividades que exigem baixa qualificação —, e abrangem entre um quarto e um terço dos trabalhadores. Segundo o pesquisador, a carga horária também ajuda a explicar a disparidade de rendimentos entre os grupos.
“Entre os plataformizados com nível superior, muitos atuam como motoristas de aplicativo, em funções abaixo da sua qualificação. Isso ajuda a explicar o rendimento menor em relação aos demais”, afirma Gustavo Geaquinto Fontes, analista do IBGE.
➡️ Contribuição x Informalidade
O estudo do IBGE também identificou que a maioria dos trabalhadores por aplicativo ainda está fora da rede de proteção previdenciária. Em 2024, só 35,9% contribuíram para a previdência, bem abaixo dos 61,9% entre os que não utilizam os aplicativos como principal fonte de renda.
A disparidade regional também chama atenção: no Norte, apenas 15,4% contribuem para a previdência, enquanto no Sul mais da metade (51,8%) faz o pagamento.
A informalidade também é uma característica marcante entre os trabalhadores por aplicativos. Em 2024, 71,1% estavam em situação informal – quase o dobro dos que não dependem de plataformas (43,8%) e acima da média do setor privado (44,3%).
As regiões Nordeste (87,7%) e Norte (84,9%) apresentaram os maiores índices de informalidade, enquanto o Centro-Oeste teve o menor percentual (61,0%).
🔎 São considerados informais os trabalhadores sem registro formal, como empregados sem carteira assinada, autônomos sem CNPJ e auxiliares familiares, por exemplo.
🚗 Condição de trabalho e destaques por ocupação
No setor de transporte por plataformas digitais, a maioria dos profissionais atua por conta própria, representando 86,1% do total, enquanto apenas 6,1% são empregadores.
Entre os empregados, 3,9% trabalham sem carteira assinada e 3,2% têm registro formal. A maioria atua nos setores de transporte, armazenagem e correios, que concentram 72,5% desses profissionais.
Já em termos de ocupação, predominam operadores de máquinas e montadores — categoria que inclui condutores de motocicletas e automóveis e que representam 72,1% do total. A pesquisa também analisou os diferentes tipos de condutores:
🚙 Condutores de automóveis:
Em 2024, o Brasil tinha cerca de 1,9 milhão de pessoas ocupadas como condutores de automóveis. Entre eles, houve crescimento de 106 mil motoristas plataformizados nesse período.
O rendimento médio mensal real desses profissionais foi R$ 341 superior ao dos não plataformizados. Por outro lado, motoristas de aplicativo trabalham, em média, cinco horas a mais por semana.
🏍️ Condutores de motocicletas:
Entre 2022 e 2024, o número de motociclistas plataformizados cresceu 140 mil, enquanto o de não plataformizados caiu 53 mil. Com isso, os trabalhadores por aplicativo representam um terço do total de condutores de motocicletas.
Os motociclistas de aplicativo tiveram rendimento médio mensal 28,2% superior ao dos não plataformizados, mas cumpriram, em média, 3,9 horas semanais a mais.
Apesar da vantagem salarial, os condutores de motocicletas apresentam altos níveis de informalidade, bem acima dos 44,3% registrados entre o total de trabalhadores do setor privado.
🤳🏼 Trabalhadores por aplicativos têm baixa autonomia sobre o próprio trabalho
A pesquisa também revelou que grande parte dos trabalhadores por aplicativo tem baixa autonomia sobre sua atividade. A maioria depende das plataformas para definir fatores como valor recebido, escolha de clientes, prazos e forma de pagamento.
Veja abaixo o percentual de trabalhadores que tiveram o valor a ser recebido definido pela plataforma:
- 91,2% dos trabalhadores de aplicativo de transporte particular de passageiros;
- 81,3% dos entregadores de aplicativo de entrega;
- 79,4% dos trabalhadores de aplicativo de táxi;
- 45,4% dos trabalhadores com outras ocupações que usam aplicativo de entrega; e
- 37,2% dos trabalhadores de aplicativo de prestação de serviços gerais ou profissionais.
Para a maioria dos trabalhadores por aplicativos, a plataforma também controla quais clientes serão atendidos e como o pagamento será realizado — com exceção dos que atuam em serviços gerais ou especializados, que têm maior autonomia.
O menor nível de dependência foi observado nos prazos de execução das tarefas. Ainda assim, em 2024, 70,4% dos entregadores, 54,8% dos motoristas de transporte particular, 53,2% dos trabalhadores de outras funções em aplicativos de entrega e 28,1% dos profissionais de serviços gerais ou especializados afirmaram que os prazos eram definidos pela plataforma.
📍 Sudeste é líder do trabalho plataformizado
Por fim, na análise regional — feita sem o detalhamento por estados, capitais e municípios — o destaque ficou com o Sudeste, que concentrou o maior número de trabalhadores por plataformas digitais em 2024. Foram 888 mil pessoas, mais da metade (53,7%) do total nacional.
Nas demais regiões, os índices variaram entre 1,4% no Sul e 1,9% nas regiões Norte e Centro-Oeste. Entre 2022 e 2024, o número de trabalhadores por aplicativos cresceu significativamente no Centro-Oeste (58,8%) e no Norte (56%).
Metodologia
Para entender melhor o cenário do trabalho por aplicativos, o IBGE considerou pessoas ocupadas com 14 anos ou mais, excluindo empregados do setor público e militares, e focou nas atividades que representam a principal fonte de renda.
A pesquisa investigou quatro categorias de plataformas digitais:
- aplicativos de táxi;
- aplicativos de transporte particular de passageiros (exceto táxi);
- aplicativos de entrega de comida e produtos; e
- aplicativos de prestação de serviços gerais ou profissionais.
O estudo ainda verificou se os trabalhadores usavam essas plataformas para atrair clientes e prestar serviços. Outras categorias, como comércio eletrônico, redes sociais, plataformas de comunicação ou teletrabalho, não foram incluídas na pesquisa.
Fonte: g1